sexta-feira, 24 de setembro de 2010

CRÔNICA PARA IDOSOS

A grande verdade, para nós idosos, é que nos deixamos arrastar pela densidade das recordações. Vejamos: quando jovens olhamos para a frente sempre com alguma meta: busca da mulher ou homem para amar, por um emprego mais rentável, para aquisição do primeiro carro, a casa própria, uma nova música, um novo conceito, aquela viagem, e assim por diante. Está, talvez, aí o grande abismo das concepções de vida.
Vamos nos perguntar: O que envelhece em nós? A resposta é bem simples, não é mesmo? É o corpo. Mas, os paradigmas sociais envelhecem nossas atitudes perante a vida. Eis aí um vetor de envelhecimento precoce. Nossa mente é muito complicada e quando somos levados ao limite muitas vezes nos perguntamos diante de uma situação inusitada: "Puxa, esse sou eu?" Compreender nossos relacionamentos com o ambiente em que vivemos é tarefa para toda a vida. Somos olhados por nosso pares sociais como os coitadinhos e, então, inventam designações como "Melhor Idade", lá vem os bailes, os chás e outros que tais, mas inserção social nada. A pior coisa que inventaram para a sociedade foi a aposentadoria profissional. A meu ver o esforço daqueles que inventam programas para os "velhinhos" deveria ser revertido para buscar soluções fraternas, compreendendo as limitações físicas e reinventar as atividades profissionais. Fomos todos, até agora, educados para descansar depois de um certo tempo, para buscar o ócio, como se isso fosse um grande prêmio.
Daí surge a luta e muito desperdício para reinventar a vida. É mas eu sou gordo, sou feio, sou negro, sou índio, sou magro, e sou velho! Pensemos: não está aí algum paradigma? E o Jô não é gordo? E o Obama não é negro? Onde será que está a diferença? Qual é o caminho? Existem muitas moradas. É só achar o caminho. Mas , o principal deles é olhar para dentro de si mesmo e dizer como Obama disse "Eu posso!".
A caminhada para o auto-conhecimento é longa e interminável, pois, se tal não fosse, a vida não teria sentido.
Quem sou eu? Porque vivo? Porque meu corpo é assim? Porque tenho limitações físicas? Porque tenho limitações intelectuais? Se ainda não temos respostas vamos buscá-las, seja na literatura, seja nas religiões, seja em atividades fraternas que tragam a paz interior. A reforma interior bem estruturada se reverte em ações positivas para si e para os outros e nos impulsiona para a felicidade. Mas, o que é a felicidade? É complicado responder essa pergunta, pois a resposta não é absoluta. Se aceitarmos que somos seres de corpo e espírito, podemos dizer que nosso corpo está feliz se está com saúde, pois assim poderá exercer plenamente suas funções biológicas. E o nosso espírito, quando está feliz? Não será a paz de espírito, entendida como o resultado da vitória das ações positivas sobre as negativas? Se for, a felicidade não é algo perene e, sim, de momentos. Essa idéia nos leva a uma luta constante para construir uma espiral da felicidade constituída de momentos vitoriosos em tempo diferente e ascendente. Um homem disse: "Conhece-te a ti mesmo!" e um outro completou com sabedoria e amor: "Ama o próximo como a ti mesmo". Já nos conhecemos? Como posso amar o próximo se não me conheço. E se não me conheço como posso amar a mim mesmo? As perguntas é que movem o mundo. E elas não têm idade! As respostas sim têm idade, por isso precisamos reinventar as respostas a cada ciclo da vida. Quando outro te perguntou aos vinte anos: "Você me ama?" E quando te fez esta pergunta aos sessenta?
Outra idéia que, ao meu ver, precisa ser trabalhada é "Perspectiva". Sem perspectiva é difícil viver feliz. A perspectiva é um vetor que pode ser apontado em qualquer direção. É ela um acelerador de nossas ações na direção dos objetivos" Eu estudo porque tenho a perspectiva de conseguir empregos que me satisfaçam, eu vou para tal lugar porque lá existem melhores oportunidades, vou me casar porque existe a perspectiva de constituir uma família e ter filhos". E as perspectivas à medida que avançamos na idade? Em primeiro lugar temos que afastar a linha de vida que diminui inexoravelmente, aceitar o seu encurtamento e não pensar nela, como aceitamos a morte e não devemos pensar nela, ou pensar só o necessário, pois elas, a linha de vida e a morte, são também uma perspectiva. Colocá-las num canto da mente, das emoções, e deixá-las ali, pois estão fora do nosso alcance modificá-las. Mas, que perspectivas existem para nós idosos? Acho que existe uma linha mestra: Lutar sempre! E dizer: "Eu posso!"