terça-feira, 12 de maio de 2015

“DOIDARRAZ, ESCANIFRADO E MAU...”

Trazendo Recordações - Janelas para o passado – II (Abril/2015)


“DOIDARRAZ, ESCANIFRADO E MAU...”  

Quando se é jovem, geralmente, a nossa mente é mais ágil e sobra lugar em nossa memória para gravarmos o que gostamos como filmes,  a letra de alguma música ou mesmo a música, alguma história, um fato interessante, um evento ou mesmo algo sem muito sentido que nos agrade. Pois, lembrei-me que, em certo tempo de minha juventude, decorei um texto bizarro que permanece até hoje em minha mente. E, para dar um pouco de atenção a esta minha mente que guarda isso e algumas outras tantas coisas, resolvi pesquisar a origem deste texto e aprofundei este estudo o qual me levou a aprender coisas novas e interessantes, bem como recordar outras. No tempo em que decorei o texto não havia Internet, mas agora ela me proporcionou uma interessante viagem.
Eis o texto que guarda minha memória:
“Doidarraz, escanifrado e mau, moralão cloacino dos estutilóquios regeneradores que a caninina facúndia de Quintilhano compele no sadismo dos maldizentes procelosos....”

È isso que recito de cor.

Pesquisando, eis que do endereço:
http://www.ciberduvidas.com/idioma.php?rid=2386
retirei o seguinte:
“Falar difícil
Duda Guennes*

Há gente que gosta de falar difícil. Alguns por sua cultura bacharelesca e outros pela vivência científica das suas profissões.

“Em 1968, o jornal "Diário de Notícias" do Rio de Janeiro publicou uma carta-aberta que o dire(c)tor do Serviço Nacional de Doenças Mentais (acho que se chamava Lopes Rodrigues ou Lopes Gonçalves, por aí) endereçou ao escritor Gustavo Corção, na qual, entre outros mimos, chamava-o de «Doidarraz escanifrado e mau, moralão cloacino dos estultilóquios regeneradores que a canina facúndia de Quintiliano compele no sadismo incoercível dos maldizentes procelosos, ao duelo hipocondríaco da luta com os moinhos da sua alucinada quixotesca nosocomial dematóide do regicídio inconsciente e de esquizopata da agressão bebefrênica...» e por aí vai.”

Parece-me que o texto ainda segue com outras “facundias de Quintilhano”. Vamos começar pelo significado das palavras para ficar mais interessante.

Significado das palavras:
-   escanifrado – magrela, raquítico
- cloacino – relativo a cloaca, latrinário, indecente
- estultilóquios – palavras estultas (Estulto: tolo, néscio, insensaro)
- facundia: facilidade de discursar, eloquência
- Quintilhano: nome com que ficou conhecido Marcus Fabius Quintiliana (Calagurris Nassica, atual Calahorra, Espanha, c 30 - ?c.100) Abriu em Roma uma escola de retórica. Em seu tratado sobre oratória, reagiu contra o gosto “moderno” representado por Sêneca e pregou um retorno ao classicismo de Cícero. Essa obra, que exerceu grande influência no Renascimento, trata, além de técnicas de retórica, de teoria educacional, crítica literária e ensinamentos morais. (Enciclopédia Larousse)
- Compele: compelir- obrigar, forçar, constranger
- Sadismo- gôso com o sofrimento alheio
- Incoercível: que não pode ser coagido
- Proceloso- relativo a procela; tempetuoso. (Procela: Tempestade marítma, agitação extraordinária)
- Hipocondríaco- aquele que sofre de hipocondria. (Hipocondria: Estado mental caracterizado por depressão e preocupação mórbita)
- Nosocomial – relativo a nosocômio. (Nosocômio: hospital)
- Dematóide- o dicionário não define
- Regicídio – assassino de um rei ou rainha
- Esquizopata – o dicionário não define. Deve ser algo como esquizofrênico (que sofre de esquizofrenia-loucura.
- Bebefrênica – o dicionário não define
- Quixotesca – que diz respeito a Dom Quixote, próprio ou característico de Dom Quixote (Dom Quixote De La Manvha, romance escrito por Miguel de Cervantes Saavedra)

Naquele tempo preocupei-me apenas em decorar o texto, razões não tenho, talvez por achar diferente ou coisa assim. Agora muitas questões me surgem:
- Por qual razão o autor do texto o escreveu e com tamanha virulência ofensiva?
- Quem é o autor e Gustavo Corção? Deste último, lembro-me vagamente que li algum de seus livros.

E uma outra questão: vontade imensa de reler Dom Quixote de La Mancha, romance que li em minha juventude, maravilhoso e que me proporcionou uma inédita visão de mundo.. Tenho ainda os dois volumes dos “Clássicos Garnier – Difusão Européia do Livro”

E Quintilhano? Fico imaginando que tenha sido o manancial onde beberam (ou bebem!) os estudantes de advocacia para aprimorar a sua facúndia.
Quanta cultura se pode extrair, por curiosidade, de um texto de tal forma escrito.

Mas, aprofundando as pesquisas:

Sobre Quintilhano ler no endereço:
http://pt.wikipedia.org/wiki/Quintiliano


Sobre Gustavo Corção:

https://www.google.com.br/webhp?sourceid=chrome-instant&rlz=1C1AVNG_enBR618BR627&ion=1&espv=2&ie=UTF-8#q=jornal+diario+de+not%C3%ADcias+1968+Rio+de+Janeiro+Gustavo+Cor%C3%A7%C3%A3o

Neste endereço se encontram artigos que nos dão uma panorâmica do pensamento de Gustavo Corção,  Entre eles:

“Gustavo Corção: apóstolo da 'linha-dura'  Bras. Hist. vol.32 no.63 São Paulo  2012”:

RESUMO
O objetivo deste artigo é analisar as crônicas de Gustavo Corção na imprensa brasileira (Diário de Notícias e O Globo) entre 1964 e 1968. A hipótese é que Gustavo Corção foi um dos artífices na esfera pública brasileira da legitimação das bases antidemocráticas da 'democracia' do regime militar. Além disso, a sua definição pela 'linha-dura' relacionou-se aos inimigos escolhidos, quase sempre personalidades católicas. Com isso poderemos perceber tanto aspectos da participação do laicato como da relação que se estabeleceu entre o Estado brasileiro e a Igreja católica no período em tela. O artigo procura demonstrar que é preciso mais atenção à recuperação dos sentidos de democracia que os grupos sociais mobilizaram naquele período, menos para justificar suas ações, e sim para entendê-las e contextualizá-las.”



CORÇÃO  E O CATOLICISMO:
XIII Congresso Brasileiro de Sociologia 
 29 de maio a 1 de junho de 2007, UFPE, Recife (PE)
Grupo de Trabalho: Pensamento Social Brasileiro
CONSAGRAÇÃO E DESLEGITIMAÇÃO: GUSTAVO CORÇÃO NA CRÔNICA BRASILEIRA.
Christiane Jalles de Paula (CPDOC)


CORÇÃO E O REGIME MILITAR:
http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-01882012000100008

Lendo sobre Corção, dá para entender o texto do artigo que origina esta minha crônica. Ele gerou muitos adversários ao longo de sua vida pública e entre eles, com certeza, o autor do texto que minha mente teima em guardar.
Esclarecido o mistério !!!
Aprendi bastante!